May 28, 2002

Fui levar meu pai na quimio e fiquei na sala de espera da clínica, lendo. Foi difícil achar uma poltrona de tanta gente que tinha.
A clínica é num casarão no Jardim Europa. A sala de espera deve ter sido uma sala de estar linda algum dia. Tem uma porta de vidro que dá para um jardim enorme e agradável. Tem posters de obras do Jasper Johns. Tem um bar com balcão redondo e banquetas em volta. Tem poltronas grandes e confortáveis. E nesse cenário as pessoas riam, conversavam, tomavam cafezinho. Fiquei observando aquilo com uma certa curiosidade - à primeira vista ninguém parecia doente, ninguém parecia triste. Tudo por causa do ambiente positivo, imagino. O que me lembrou das primeiras dúvidas que me vieram à cabeça quando o câncer invadiu nossa vida : como alguém pode conviver com isso? Minha vontade na primeira semana depois do diagnóstico era de me enterrar em casa pra sempre, chorar até secar, não desgrudar do meu pai um segundo, me sentindo culpada por todo o tempo que não passei com ele. Não ia mais trabalhar, sair nem nada. Minha mãe e minha irmã, idem. Mas não seria uma boa. Imagine meu pai trancado em casa com três urubus choramingando em volta. Ica. Hoje, todo mundo toca a vida, a gente faz piada com meu pai. Meu pai faz piada com a gente. Assistimos a TV, comemos juntos. A nossa qualidade de vida de certa forma melhorou, porque estamos todos felizes de estarmos juntos. Isso faz a gente pular da cama a cada dia, é impressionante. E chorar, bem, cada um deixa pra fazê-lo no seu próprio travesseiro depois.
Eu lembro que ficava surpresa quando via alguém que tinha um parente próximo doente rindo, sorrindo, vivendo normalmente. Agora acho que entendo.

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