November 27, 2007

Não poderia haver lugar mais adequado para abrigar a fantástica exposição "Andy Warhol : Other Voices, Other Rooms". O antigo prédio dos Correios, uma construção feia, desgastada e espaçosa ao lado da Estação Central, dá o tom ideal da NY da Factory.

A primeira sala conta uma vida em fotos : Warhol criança, jovem, em drag, antes e depois da plástica no nariz, retratado por Avedon, Mapplethorpe, auto-retratos, fotos de festas e a infame tentativa de assassinato por Valerie Solanas, como garoto-propaganda, com Miles alguns dias antes de falecer. Nas outras paredes, projeções de 4 filmes sobre o artista : dois Jonas Mekas, um Marie Menken e o famoso "Andy Warhol's Explosive Plastic Inevitable", de Ronald Nameth. Caos de imagens em p&b ao som de Velvet Underground.

A sala Cosmos é a ala das artes gráficas : mas aqui, as latas de sopa e Marilyns coloridas não são a grande atração, e sim a chance de ver gravuras, rabiscos, contatos, recortes de jornal, capas de discos, polaroids e até uma coleção da revista Interview, criada por Warhol como um zine sobre cinema e que se tornou um ícone fashion nos anos 70 e 80 (tinha até no Brasil, lembram? Não sei se era related ou só cópia) com as suas capas lindíssimas. Além disso, há estações com diversos vídeos realizados na Factory - os Factory Diaries - registrando desde processos de criação a uma visita da Liza Minelli, passando por uma "carta a Man Ray", onde ele não sabe mais o que falar depois de um ponto e repete "Man Ray" sem parar pra preencher o tempo. E cabines de áudio, com gravações de conversas variadas e, claro, uma gravação de Nico cantando "I'll Be Your Mirror", nonstop. Confesso que parei mais de uma vez nessa :-).

Mas o melhor ainda não era isso! A sala seguinte, Filmscape, exibe 19 filmes dentre a extensa produção do papa do pop. O clima da instalação é de uma certa cacofonia, dos fragmentos de áudio que escapam das estações e as dezenas de imagens flutuando em telões iluminados, misturados aos comentários assombrados ou divertidos dos visitantes. Fui direto ao centro e me sentei diante do emblemático "The Chelsea Girls", exibido segundo o conceito original - tela dupla, com duas "histórias" exibidas simultaneamente e lado-a-lado. As histórias não têm relação entre si e nem nexo - a maioria são improvisações on-camera (recorrentes em toda a filmografia do Warhol), mas visualmente são hipnotizantes. Assisti a uma boa meia hora (são mais de 3h), e por sorte peguei justamente a da Nico e a do Gerard Malanga.



Mas os outros filmes são igualmente mandatórios - "The Naked Restaurant", onde a Viva comanda um restaurante...nu. Todo mundo nu, discutindo assuntos do dia, como Cuba e Castro; "Kitchen", com a Edie Sedgwick mostrando os pernões numa discussão nonsense numa cozinha; "Mrs. Warhol", estrelando a mãe do Warhol, o imperdível "The Velvet Underground & Nico: A Symphony of Sound", mostrando uma jam do VU na Factory interrompida pela chegada da polícia (chamada pelos vizinhos que reclamaram do barulho); "Henry Geldzahler", uma "entrevista" de 99 minutos, onde Warhol nem esteve presente na maior parte do tempo, e Geldzahler foi deixado em frente à câmera - interagindo com ela no começo, e depois simplesmente parado até o filme acabar (gênio, analiso melhor em outro post); e um dos que achei mais brilhantes, "Outer and Inner Space", que coloca a Edie Sedgwick falando, tendo ao fundo/ao lado uma tela mostrando a própria numa outra gravação, falando outras coisas. Isso tudo gravado por duas câmeras diferentes, portanto a imagem é quadruplicada. Peguei um trecho em que a Edie "gravada" espirra, seguida de um espirro da "real" e achei incrível, ensaiado ou não.



Acabou? Não! A sala seguinte, TV-Scape, mostra os 42 episódios de uma série de TV criada pelo Warhol de 79 a 87, "Andy Warhol's TV". Esses programas são a maior síntese da cultura pop do século XX, hands down. Todos os nomes da música, moda, cinema, TV, literatura e arte que conhecemos estão lá : Debbie Harry, Marc Jacobs, Yoko Ono, Rob Lowe, Diana Vreeland, David Hockney...you name it. Até a Betty Lago.

Mas o ícone máximo do pop sempre será o próprio Warhol. Até sua morte, não existia veículo que ele não tivesse explorado, movimentos que ele não tivesse influenciado, personalidades que ele não tivesse conhecido. Faz vinte anos de sua morte, e ainda há tanto o que explorar em sua extensíssima obra que eu poderia falar aqui horas. Certamente essa exposição é uma das mais completas fora do The Andy Warhol Museum, e uma grande chance de sentir um pouco da NY fervilhante e criativa daqueles anos loucos.

1 comment:

Cris Ambrosio said...

Pois é, é impossível desvincular o pop do Warhol. Eu até gosto das obras dele, mas elas não me fazem sentir nada xD

Brilhante essa idéia de colocar a exposição num prédio parecido com a Factory, demais.